Tecnologia Digital: Extensão ou substituição? Mais outras interrogações e a pedagogia no horizonte

 EM 05.01.2024 

Tema em desenvolvimento, iniciado a partir das interrogações de Isabel Calado, que tomamos a liberdade de fazer nossas, saídas da 75ª "Tertúlia Inquietações Pedagógicas".

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DA VIDA DEPENDENTE DA TECNOLOGIA

Quando me interrogo sobre a importância que os dispositivos digitais têm na minha vida, procuro convencer-me de que têm uma importância limitada, de que posso viver sem eles, desde que tenha acesso a livros, jornais, correio..., aos dispositivos tradicionais que me ligam ao mundo. Não sei se será exactamente assim! Embora convencido de que não estou viciado em tecnologia, e de não precisar de me sujeitar a um longo processo de desintoxicação, estou certo de que um eventual afastamento de dispositivos digitais por longos períodos de tempo, exigir-me-ia um grande esforço de adaptação.

A tecnologia digital foi entrando na minha vida naturalmente: a máquina de calcular primeiro; depois a computador pessoal, com processadores de texto, folhas de cálculo..., a ligação à internet e tudo mais que a internet ofereceu. Tudo incorporado sem esforço: digamos que a tecnologia impôs-se sem convite; a porta estava aberta e ela, simplesmente, entrou. E ficou.

Sem disso me aperceber, algumas plataformas digitais tornaram-se, lentamente, lugares imprescindíveis de encontro, fóruns impossíveis fora dos espaços digitais: é outra a diversidade de encontros que os espaços digitais proporcionam, e acho que já não é possível dispensá-los a favor dos espaços físicos que demoram a reencontrar-se, com a força dos tempos pré-pandémicos: a coabitação ente os diferentes espaços é hoje praticamente obrigatória. Depois, para ajudar à festa, são espaços que viajam connosco em smartphones e outros dispositivos com os seus dados móveis, quais 
próteses, quase extensões do corpo [Óscar Lopes diria, talvez, que "mais uma veza mão cresceu"*]
. Podia viver sem tecnologia? Claro que podia. Mas esta é a resposta de alguém que cresceu num mundo analógico, para quem o papel e a caneta continuam a ser instrumentos importantíssimos de trabalho e que, pelo lugar de onde vem, com mais ou menos esforço esforço, reaprenderia a viver sem o 
digital.

Vem isto a propósito das interrogações lançadas na 75ª Tertúlia Inquietações Pedagógicas. Embora a minha preocupação, como professor, no que diz respeito à tecnologia digital, tenha ido no sentido do uso que lhe poderia dar como instrumento auxiliar do meu trabalho, de tirar o melhor partido dela, no dia-a-dia da sala de aula, hoje acho que acompanharia Isabel Calado, na sua preocupação, e estaria muito mais preocupado com o que a tecnologia pode fazer connosco, e não tanto com o que nós podemos fazer com ela

Trata-se, sem recusar o conforto que a tecnologia traz às nossas vidas, de pensar o seu uso de um modo que não nos faça seus escravos, que nos paralisa quando nos afastamos dela. É que, à medida que ela se vai tornando mais poderosa, temos vindo a deixar que nos seduza ao ponto de lhe delegarmos funções que têm sido só nossas: deixamo-nos substituir por ela, levados pela confiança cega na infalibilidade da técnica! Cuidado - avisa António Dias Figueiredo - com o que delegamos na tecnologia! E elege, como prioridade, a aposta naquele saber que distingue o professor como profissional da educação: a PEDAGOGIA, a prática PEDAGÓGICA, que não é, nem será, coisa de máquina, mesmo que apoiada nas ciências da "inteligência artificial", por mais "inteligente" que seja.

Daniel Lousada